“A pandemia de covid-19 e as epidemias de violência” é o tema da Semana Estadual de Prevenção aos Homicídios de Jovens no Ceará em 2020, que terá uma série de atividades no período de 9 a 13 de novembro. Com o objetivo de sensibilizar e mobilizar o poder público e a sociedade em todo o estado acerca do tema e para que se engajem na programação da semana, o Comitê de Prevenção e Combate à Violência, da Assembleia Legislativa do Ceará, participa de um debate no YouTube, na próxima quinta-feira, 29 de outubro, às 15 horas, pelo canal da Associação dos Municípios do Estado do Ceará – Aprece.
O Programa Quinta com Debate é uma atividade promovida pela Aprece, semanalmente, desde o início da pandemia do novo coronavírus no estado. A cada semana, a Associação dos Municípios do Estado do Ceará convida especialistas, pesquisadores, profissionais e gestores públicos para debaterem assuntos que interessam diretamente à gestão municipal e aos munícipes. Embora o programa tenha sido criado durante a pandemia, em função das limitações impostas para a realização de atividades presenciais que causassem aglomeração, os temas abarcam questões para além dos problemas sanitários que afetam os municípios.
O debate virtual sobre “a pandemia de covid-19 e as epidemias de violência” foi uma sugestão apresentada pela própria Aprece, ao ser convidada para se integrar às instituições que estão programando atividades para a Semana Estadual de Prevenção aos Homicídios de Jovens no Ceará, também conhecida como Semana Cada Vida Importa. A proposta foi aceita de imediato pelo Comitê de Prevenção e Combate à Violência, até porque é uma preocupação do colegiado fazer com que as prefeituras reconheçam não apenas a gravidade do problema da violência letal para os municípios, mas também as possibilidades que a gestão municipal tem de prevenir homicídios.
O incômodo causado pela falta de debate sobre políticas de segurança nas campanhas eleitorais de 2020 no Ceará motivou a Aprece a defender que a participação da associação na Semana Estadual de Prevenção aos Homicídios de Jovens tivesse início antes mesmo do período definido – segunda semana de novembro. Com a live da próxima quinta-feira, a Aprece espera despertar os candidatos e a população local para que o tema seja posto em discussão nas duas últimas semanas que antecedem o dia da eleição – 15 de novembro.
A política pública de segurança não é uma responsabilidade exclusiva dos governos estaduais. Aos gestores dos estados cabe, entre outras tarefas, estruturar e organizar o sistema policial, com uma Polícia Militar para prevenir ações criminosas e uma Polícia Civil para investigar os delitos. Mas além do aparelho policial ter demonstrado desvios, falhas e fragilidades no cumprimento das respectivas atribuições, a prevenção da violência é também um dever dos gestores municipais, por meio da criação, da ampliação e do fortalecimento de programas sociais, constituindo, assim, parte essencial de uma política pública de segurança.
O contexto de violência no Ceará se agravou bastante nos últimos 20 anos. Em 2017, o estado atingiu um número recorde de agressões fatais e o maior crescimento da taxa de homicídios entre todas as unidades da federação. No primeiro semestre de 2020, o Ceará voltou a registrar o maior aumento da violência letal no Brasil – 96,6% mais casos de mortes violentas intencionais do que no mesmo período de 2019, como apontou o Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2020, divulgado no último dia 18 de outubro.
A insegurança por todo o estado já não é mais só uma sensação. A violência, que afetava principalmente as cidades de médio e grande porte, agora se expandiu para os pequenos municípios, causando medo, sofrimento e morte nas sedes e também nos distritos. A exemplo de outros estados do Nordeste, embora de forma ainda mais intensa, o Ceará passa por um processo de interiorização da violência no Brasil, que se intensificou desde o início dos anos 2000, e ganhou contornos mais graves a partir de 2015, com o domínio de facções criminosas, que se estendeu da capital Fortaleza para os municípios das outras regiões do estado.
A situação tem preocupado a Associação dos Municípios do Estado do Ceará, mas o tema da segurança ainda não despertou os gestores para o debate profundo e sistemático sobre a necessidade de os municípios criarem programas para a prevenção da violência. Em geral, os prefeitos ainda compreendem que o enfrentamento desse problema é de responsabilidade exclusiva do Governo do Estado e que envolve principalmente o aumento de efetivo policial e as ações ostensivas e de repressão à criminalidade.
O Comitê de Prevenção e Combate à Violência, da Assembleia Legislativa, reafirma a necessidade de políticas focadas na prevenção da criminalidade e dos homicídios e em programas de mediação de conflitos. As recomendações aos gestores públicos apresentadas ao fim de 2016, primeiro ano de atividades do comitê, reúnem um conjunto de ações que demandam pequeno ou nenhum aporte de recursos aos orçamentos municipais. A execução das propostas depende menos de dinheiro e mais de vontade política para qualificar projetos e programas já existentes nas áreas da assistência social, cultura, educação, esporte, formação profissional, geração de emprego, iluminação pública, lazer, mobilidade, moradia, saúde e urbanismo.
Coincidentemente, os dois últimos temas abordados pela Aprece no Programa Quinta com Debate tratam de políticas fundamentais para a prevenção de homicídios. No último dia 22, a live foi sobre o Plano Emergencial do Sistema Único de Assistência Social (Suas), apresentado ao Congresso Nacional por meio do Projeto de Lei nº 4.292/2020. O objetivo foi discutir a importância do plano para o fortalecimento da política de assistência social e o reforço da capacidade da rede de atendimento às pessoas em situação de vulnerabilidade, agravada pela pandemia de covid-19. O projeto prevê a destinação de R$ 4 bilhões para garantir o atendimento da população nos serviços de assistência social nos estados e, principalmente, nos municípios.
Uma semana antes, no Programa Quinta com Debate do dia 15 de outubro, a Aprece reuniu convidados para tratarem sobre a importância do investimento em políticas públicas para a primeira infância, como meio de transformação das condições de vida das crianças e de suas famílias, principalmente das que se encontram em situação de vulnerabilidade, exclusão e risco social, visando à promoção do desenvolvimento integral.
PARA LEMBRAR OS CINCO ANOS DA CHACINA DE MESSEJANA
Em 2020, a Semana Estadual de Prevenção aos Homicídios de Jovens no Ceará será realizada no período de 9 a 13 de novembro de 2020. Mais conhecida como Semana Cada Vida Importa, a iniciativa foi criada em 2017, com a aprovação pela Assembleia Legislativa do Ceará e a sanção pelo governador Camilo Santana do projeto que resultou na Lei n.º 16.482, de 19 de dezembro.
A proposta foi apresentada em decorrência do trabalho desenvolvido pelo então Comitê Cearense pela Prevenção de Homicídios na Adolescente, criado em 2015 e renomeado em 2019 como Comitê de Prevenção e Combate à Violência. Desde 2018, primeiro ano de realização da Semana Cada Vida, o comitê tem assumido a função de articular e mobilizar diversas organizações do poder público e da sociedade para o desenvolvimento de uma ampla programação.
A lei que instituiu a Semana Estadual de Prevenção aos Homicídios de Jovens no Ceará prevê que o poder público, em parceria com grupos de jovens, movimentos sociais e universidades, organize ou estimule campanhas, intervenções artísticas, manifestações, palestras e outras atividades em defesa da vida de adolescentes e jovens. A criação do dispositivo legal tem como objetivo sensibilizar a população cearense acerca da mortalidade juvenil no Ceará em decorrência dos homicídios e promover o debate entre governos e organizações da sociedade para a execução de políticas de prevenção aos assassinatos.
Além de fazer constar no calendário oficial de eventos do Ceará a Semana Estadual de Prevenção aos Homicídios de Jovens, a lei instituiu a data de 12 de novembro como Dia Estadual de Prevenção aos Homicídios de Jovens. A Semana Cada Vida Importa transcorre sempre na semana do dia 12 de novembro em memória das vítimas da Chacina de Messejana, que aconteceu em 2015.
O massacre deixou 11 mortos, entre eles oito adolescentes de 16 a 19 anos, em três bairros vizinhos de Fortaleza – Curió, José de Alencar e Messejana. O Ministério Público do Ceará pediu a prisão preventiva de 45 policiais militares por terem participado de alguma forma na sequência de assassinatos na madrugada de 12 de novembro. A Justiça só não acatou a denúncia contra um tenente-coronel e determinou que 34 policiais fossem submetidos a júri popular. Cinco anos depois, as famílias das vítimas ainda estão aguardando os julgamentos.