Uma frente de mobilização envolvendo professores e pesquisadores de diferentes universidades está promovendo um conjunto de atividades para sensibilizar a comunidade acadêmica contra o extermínio da população jovem, negra e pobre das periferias de Fortaleza e em outras regiões do Ceará. Em 2017, 5.134 pessoas foram assassinadas, batendo o recorde de homicídios já registrados no Estado.

Reunidos no “Movimento C​ada ​V​ida ​I​mporta: a universidade na prevenção e enfrentamento ​à​ violência no Ceará”, mais de 30 laboratórios, grupos de pesquisa e projetos de extensão assinaram uma nota de repúdio à violência cotidiana vivenciada no Estado. A iniciativa também é apoiada por organizações da sociedade civil e o Comitê Cearense pela Prevenção de Homicídios na Adolescência (CCPHA).

No final de fevereiro, inaugurando o semestre de 2018.1, professores de diferentes áreas que aderiram ao movimento pautaram a temática na sala de aula. A proposta do grupo é promover, nos próximos meses, seminários e eventos sobre a prevenção e o enfrentamento aos homicídios em diferentes departamentos das universidades.

Uma das intenções do movimento é contribuir com a desnaturalização dessas mortes no Estado, desconstruindo a narrativa de que as pessoas que foram assinadas “mereceram” aquele destino. “Também nos indignamos com as tentativas de justificação desses assassinatos, sob a alegativa de possíveis envolvimentos das vítimas com crimes e com o tráfico de drogas. Nosso compromisso com a produção de conhecimentos e com práticas sociais críticas à realidade nos leva ao entendimento de que a rede de violência instalada em nosso estado é complexa e se expande conforme o aumento da desigualdade social”, reforça a nota.

Estão integrando a mobilização professores da Universidade Federal do Ceará (UFC), Universidade Estadual do Ceará (UECE), Universidade de Fortaleza (Unifor), Centro Universitário Devry Fanor (UniFanor), Centro Universitário 7 de Setembro (Uni7), Centro Universitário Christus (UniChristus), Instituto Federal do Ceará (IFCE), Centro Universitário Estácio do Ceará e Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab).

 

Manifesto de repúdio e solidariedade

Viemos manifestar nosso repúdio e indignação com o estado de violência e do que consideramos extermínio, principalmente da população jovem, negra e pobre das periferias de Fortaleza e em outras regiões do Ceará. O ano de 2017 ficou marcado como o mais violento da história local, ultrapassando cinco mil crimes violentos letais e intencionais. Ainda sob forte impacto desses acontecimentos, a sociedade cearense foi surpreendida, no primeiro mês de 2018, com o agravo do quadro de violência. Nosso estado foi palco de outras duas grandes tragédias: a Chacina de Cajazeiras, que vitimou oito mulheres e seis homens, a maior parte jovens e, inclusive, uma criança; e a Chacina na Cadeia Pública de Itapajé, na qual 10 presos foram assassinados.

Com aproximadamente 482 homicídios, segundo dados da Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social do Estado, janeiro de 2018 foi o mês do ano mais violento desde 2013. É, portanto, inadmissível minimizar a gravidade das chacinas e dos assassinatos que vêm ocorrendo de forma crescente na Capital e no Estado do Ceará, tomando tais ocorrências como “casos isolados”, em que vidas estão sendo absurdamente eliminadas sem que providências efetivas sejam apresentadas pelo poder público, através de órgãos competentes.
Também nos indignamos com as tentativas de justificação desses assassinatos, sob a alegativa de possíveis envolvimentos das vítimas com crimes e com o tráfico de drogas. Nosso compromisso com a produção de conhecimentos e com práticas sociais críticas à realidade nos leva ao entendimento de que a rede de violência instalada em nosso estado é complexa e se expande conforme o aumento da desigualdade social. Agir dentro da legalidade e combater as injustiças e iniquidades sociais deveriam ser o eixo condutor de uma POLÍTICA de segurança pública na qual “toda vida importa”.
Consideramos, portanto, necessária a mobilização da sociedade civil para que não se prolongue este estado de exceção em que vivemos nos últimos anos. Não queremos e não estamos indiferentes a ele, que vem fazendo vítimas e deixando familiares, amigos e pessoas próximas com suas dores e perdas sem eco e sem visibilidade.
Ao mesmo tempo, expressamos nosso sentimento de pesar e compartilhamos com o sofrimento de tantos que estão aterrorizados frente à incerteza, ao desamparo e à angústia quanto à expectativa dos desdobramentos futuros dessa situação, e até a incerteza sobre uma próxima chacina.
Como coletividade, queremos manifestar a nossa solidariedade às famílias enlutadas e, em associação com os movimentos sociais organizados, atuar na perspectiva de contribuir para interromper esta cadeia de violência.

Estamos juntos e juntas nesta luta.

Fortaleza, 22 de fevereiro de 2018.